De casa para o trabalho, do trabalho para casa. A vida do brasiliense, de segunda a sexta-feira, no transporte público lotado ou de carro, nas principais vias de acesso ao Plano Piloto, poderá ser impactada positivamente ou negativamente com o projeto Zona Verde. Inspirado no modelo desenvolvido pela cidade de São Paulo, o projeto cobrará R$ 3 para carros e R$ 1,50 para motos, em estacionamentos públicos de Brasília. Segundo as estimativas, em um mês de utilização, o contribuinte pode gastar até R$ 240, fora os valores com combustível e manutenção veicular.
Dividido em quatro bolsões, denominados de ipês amarelo, roxo, rosa e branco, o projeto foi desenvolvido pela Secretaria de Transporte e Mobilidade (Semob) e aguarda parecer definitivo do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) para entrar em uso. Ao longo da tramitação na Corte, ele sofreu alterações significativas. Antes, a intenção era cobrar o valor aos motoristas pela permanência do veículo por uma hora. Agora, o tempo foi estendido e diferenciado nos quatros bolsões, onde serão as áreas do estacionamento rotativo.
Bolsões de vagas
O bolsão ipê amarelo corresponde a áreas onde há majoritariamente comércio, residências e imóveis de uso misto, abrangendo as quadras das asas Sul e Norte — exceto Zona Central —, Sudoeste, Setor de Indústrias Gráficas (SIG) e Setor de Indústria e Abastecimento (SIA). A cobrança será de três em três horas, pelo período de 9h às 20h. Antes e posterior a isso não será exigido nenhum valor ao motorista. O valor será de R$ 3 para carros e R$ 1,50 para motos.
Nos bolsões do ipê roxo, que correspondem aos setores bancários; comerciais; hoteleiro; de rádio e televisão; e hospitalar norte e sul, os valores a serem cobrados nos sistemas de “park and ride” — estacione e embarque, em tradução livre — serão os mesmos. Nele, a cobrança será das 8h às 18h, de cinco em cinco horas. O ipê rosa, que abrange áreas próximas ao Eixo Monumental, atendendo principalmente os órgãos distritais, como o Palácio do Buriti e a Câmara Legislativa (CLDF), e federais, da Esplanada dos Ministérios, a cobrança ocorrerá das 7h às 19h, de 12 em 12 horas.
O único ipê que se diferencia dos demais é o branco. Nele, os motoristas de carros seguem pagando R$ 3, sendo uma única taxa paga no dia, enquanto motocicletas serão isentas. A intenção é que esses motoristas deixem seus veículos nos estacionamentos, onde há o metrô e estações do BRT por perto, e optem por utilizar o transporte público, onde não pagarão nada — contanto que o transporte seja utilizado no mesmo dia.
Para os moradores das regiões onde serão instalados os bolsões, o governo pretende realizar o cadastro de três veículos por residência, que ficarão isentos da cobrança. Ao todo, são 115 mil vagas no projeto da Zona Verde, que podem ser exploradas por uma lei complementar de 2004, sancionada pelo então governador Joaquim Roriz.
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Peso no bolso
Na ponta do lápis, considerando que em média há 20 dias úteis no mês, o contribuinte que quiser pegar o BRT ou Metrô e usufruir do projeto, terá de pagar R$ 60 mensais para estacionar seu carro nos bolsões do ipê branco, estando isento de pagar a passagem no transporte público.
“A maior parte das pessoas vai trabalhar de carro ou de moto em regiões comerciais, ou seja, no ipê amarelo. Parte delas vai pagar esse valor cheio, pois ficam raramente menos de seis horas no trabalho. Considerando 20 dias úteis como número médio, vai dar R$ 240 mensais para as pessoas que usam o carro, e R$ 120 para as pessoas que vão ao trabalho de moto”, explica o economista e professor do IDP, Mathias Schneid. “A minha percepção é que esse tipo de iniciativa pode aumentar a demanda dos comércios, porque muitas vezes as pessoas deixam de consumir pela falta de estacionamento. É o mesmo para veículos de aplicativo e o próprio transporte público. Mas, pensando na pessoa que vai todos os dias trabalhar, vai aumentar os custos”, conclui o economista.
Cobrança
O especialista em trânsito Artur Morais, descreve que, na visão técnica, a proposta do governo de cobrar vaga em estacionamento público é válida. Ele cita que, conforme a população vai adquirindo mais veículos, mais vagas serão necessárias — o que poderia acabar com a vegetação da área central de Brasília. “Se hoje fossemos destinar área na região do Plano Piloto para estacionamento, iríamos com áreas de convivência e a própria vegetação, já que não teria vaga para todo mundo. É um projeto viável, e que já deveria estar funcionando há muito tempo, porque ocorre nas maiores cidades do mundo”.
Morais acrescenta que, a proposta de ter bolsões para que os motoristas deixem seus veículos e peguem um transporte público é interessante, mas reforça que os valores arrecadados devem ter investidos para melhorar o transporte público. “Não dá para entender: destinamos uma área, que é parte de um solo, para uma pessoa que vai sozinha para o Plano Piloto, deixando o carro durante 10 horas ocupando aquele espaço, sem cobrar nada”, explica. “É uma proposta que vejo com bons olhos. O dinheiro a ser arrecadado, na parte que cabe ao Estado, deve ser integralmente investido no transporte público, para melhorar a qualidade do serviço, além de baratear o preço que o passageiro paga”, completa.
O professor de transportes de engenharia civil da Universidade Católica de Brasília (UCB) Edson Benício aponta que o DF vive um cenário de desequilíbrio. Para ele, transformar as vagas para uso rotativo traz mais dinâmica e movimentação de pessoas, o que pode ou não favorecer o comércio. “Em outras cidades, ao determinar estacionamento rotativo em regiões específicas, prejudicou o comércio. Em outras cidades, não. É preciso que se faça um estudo para uma análise mais aprofundada”, explica.
“O governo está atacando um problema, que é o desequilíbrio de vagas. Eu vejo que a Parceria Público-Privada é benéfica, porque é uma realidade de quase todas as grandes cidades do mundo. Se der certo, é algo para fazer em outras regiões, como Águas Claras, Taguatinga, Samambaia. O estacionamento rotativo tem que acontecer. O DF está há muito tempo sem ter esse tipo de política, porque outras cidades avançaram”, completa Benício.